quinta-feira, março 30, 2006


Vender parte dos F-16MLU ?

Em meados do mês de Março de 2006, e a propósito da aproximação da discussão da Lei de Programação Militar, foi apresentada publicamente uma proposta por parte de um partido político com representação parlamentar, que propõe a venda de 10 (dez) unidades dos actuais F-16 da Força Aérea Portuguesa.

O partido em causa, apresenta como uma das soluções para reduzir os apertos orçamentais a venda de aeronaves F-16A/B-MLU (a seguir designados por F-16MLU ou apenas MLU), ou seja, com a instalação e incorporação do kit MLU, que as transforma em aeronaves mais modernas.

A vantagem da possibilidade apresentada prende-se com o facto de, procedendo à modernização das aeronaves ser pelo menos em teoria possível efectuar a sua venda no mercado internacional a um preço aproximado do custo da modernização, mantendo assim postos de trabalho na industria nacional. Tal preço deverá roncar os 8 milhões de Euros, o preço que o o Chile pagou por aeronaves idênticas compradas à Holanda.

No entanto, a proposta de venda dos F-16MLU, depara-se com um problema político, que decorre do facto de, sendo aeronaves americanas (20 delas compradas novas na fábrica e outras 20 adquiridas em segunda mão), a sua venda necessitar de autorização do governo norte-americano.

Os potenciais clientes, no entanto, não serão provavelmente países europeus. Parte deles estão envolvidos com custosos projectos de modernização e substituição de aeronaves mais antigas por outras novas, (Eurofighter e Grippen) as quais são mais capazes que os F-16MLU e outros, mais pequenos, não têm recursos financeiros nem dimensão para operar mesmo os 10 F-16MLU que Portugal poderia vender. Entre países com capacidade para adquirir este tipo de aeronave estariam por exemplo a Eslováquia, que ainda opera aeronaves de fabrico russo, mas este país assinou há pouco um contrato para a completa modernização dos seus MIG-29 com equipamentos ocidentais, e outros países como a Roménia foram alvo de propostas para a modernização de MIG-29 para padrões ocidentais. A Eslovénia, parece não ter dimensão para operar uma esquadra de aeronaves como o F-16MLU, uma vez que a sua Força Aérea se resume a aeronaves de asa rotativa e a aviões de transporte.

Em termos de Europa, outros países, ou não têm capacidade para a operação deste avião, ou então não têm necessidade dele, por operarem outros mais sofisticados.

Fora da Europa, os potências clientes, também não abundam, e surge o problema de poder até haver potenciais clientes para a aeronave, mas cuja transação, ao ter que ser autorizada por Washington se tornaria impossível.

A Venezuela, por exemplo, não consegue sequer manter os seus F-16A/B-Block 15 (idênticos aos nossos F-16 não modernizados) no ar, e o governo americano, ainda há pouco proibiu a Espanha de vender aviões C-295 para aquele país da América do Sul.

Outra versão mais próxima é Marrocos, e aqui existe a mais que provável oposição de Espanha, pois embora 10 aeronaves F-16MLU sejam pouco quando comparadas com o arsenal espanhol, aumentariam grandemente as capacidades das forças marroquinas.

É aliás o problema das autorizações de Washington, que leva muitos países a duvidar dos equipamentos americanos, porque se os países da NATO podem dispor das armas sofisticadas que um F-16MLU utiliza, outros países não têm a mesma facilidade, ficando essas armas, (como os mísseis ar-ar AIM-120 AMRAAM) nos Estados Unidos, com o compromisso de serem entregues em caso de necessidade.

Portando, a possibilidade de venda dos F-16MLU, que à partida teria algum interesse (isto se concluirmos que será difícil e demasiado caro completar duas esquadras com 20 aparelhos cada uma) resvala em problemas técnicos e políticos, não sendo a venda viável, sem que exista a autorização respectiva por parte do governo dos E.U.A.

Resta saber se, tomando o governo a decisão de reduzir o numero de F-16MLU a operar, se justifica efectuar a modernização dos últimos 10 aparelhos, ou se os equipamentos já adquiridos deveriam ser vendidos, (não se tocando nas carcaças dos F-16 mais antigos) propondo Portugal o programa de modernização a outras forças aéreas.

No entanto, tal tipo de solução, enfrentará os mesmos problemas políticos que se colocam para os aviões actuais.

Mensagem automática publicada por : Paulo Mendonça

domingo, março 12, 2006


Milosevic: Como criar um mártir

A morte do antigo presidente da Jugoslávia e da Sérvia, Slobodan Milosevic em Haia na Holanda, onde estava a ser julgado por crimes relacionados com o conflito na antiga Jugoslávia e na província Sérvia do Kosovo, dificilmente poderia ser mais inconveniente. Milosevic tinha sido vitima de vários problemas de saúde ao longo da sua presença na prisão em Haia, tendo recebido várias vezes tratamento médico. Os seus advogados, solicitaram autorização para que Milosevic se deslocasse a Moscovo para receber tratamento médico numa clinica Russa, o que foi negado pelo tribunal. Para a opinião pública a nível mundial, independentemente de fazer pouco sentido receber tratamento na Rússia, quando existem na Europa Ocidental instituições de saúde que se não são as melhores estão seguramente entre as melhores do mundo, a imagem que fica, é a de um indivíduo preso, ao qual foi negado o direito ao tratamento de que necessitava. Para cúmulo, o antigo presidente da Sérvia e os seus advogados tinham várias vezes referido que alguém tinha tentado eliminar fisicamente o arguido, através de envenenamento. Por muito óbvio que para um ocidental possa parecer o oportunismo da deslocação à Rússia e da alegação de envenenamento na prisão, a mesma coisa não vai acontecer seguramente na Sérvia. Milosevic, poderá com toda a facilidade transformar-se depois de morto, num mito, num herói e num mártir do nacionalismo sérvio. Os nacionalismo europeus têm raízes extremamente profundas, na história e na religião e são a razão de ser das nações. A Sérvia sempre se viu como uma fortaleza da resistência por um lado à pressão do catolicismo vindo da Áustria e do islão de origem otomana. Resistiu a todas essas pressões, mantendo as suas raízes baseadas no cristianismo ortodoxo e na sua ligação à Rússia e ao mundo eslavo. O nacionalismo sérvio e as suas ramificações, estiveram na origem da primeira guerra mundial. O nacionalismo sérvio, foi uma das razões da resistência à invasão alemã, sendo a Jugoslávia praticamente o único país que se libertou sozinho do III Reich de Hitler. Os sérvios defenderam violentamente a sua cultura contra tudo e contra todos, e para muitos deles, os acontecimentos violentos dos anos 90 estão justificados pela necessidade, como estiveram a resistência aos austríacos, aos turcos ou aos alemães. O tribunal de Haia, e a imbecilidade dos seus responsáveis, não teve nenhuma das características dos sérvios em consideração. Esqueceu o óbvio, pensando que todos os povos da Europa se medem pela bitola asséptica e desinfectada da Europa politicamente correcta. Essa mesma Europa politicamente correcta, agiu de forma desconexa, irresponsável e incompetente na gestão da imagem de Milosevic e da sua passagem por Haia. Saiu-lhe o tiro pela culatra. Na Sérvia acabou de nascer mais um mito, mais um herói e mais um mártir.

Mensagem automática publicada por : Paulo Mendonça